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Vôo Noturno

A história de um vôo pioneiro; a crônica de um vôo terreno. Impressões sobre o segundo livro do escritor francês Antoine de Saint-Exupery.



O ônibus balançava. Vazio. Só assim pude enxergar as páginas, sob um espectro de luz focado quase sobre o assento ao lado.
Ainda escuro lá fora. Enquanto lia sobre o dourado início da noite, presenciava seu pálido fim.
As palavras embalavam-me e transformavam meu lânguido movimento em vôo suave. E, não as palavras, mas o vôo, umedecia meus olhos e pensamento.
A própria leitura fazia-me voar além dela, desviando minha atenção para as pequenas paisagens, privando-me de si.
Tamanha é a sensibilidade com a qual Antoine de Saint-Exupéry – o escritor - descreve o Vôo Noturno, que todas sensações mundanas parecem entrar em seu enredo, e completá-lo. Recria-se a sensação de voar, aos que já voaram. Aos que nunca, talvez se crie a fantasia – ainda mais intensa.
Eis a perfeita leitura de viagem. Como quisera estar voando e perceber, através do pioneiro e entusiasta, a grandeza deste ato, desta conquista. Algo que se sente na primeira vez, com os olhos presos à janela, às luzes da noite brilhando como uma constelação que abriga tantas vidas; mas que, aos poucos, banaliza-se.
E não só sobre o vôo: sobre a coragem do piloto, a austeridade do patrão, a carência do inspetor e a espera da jovem esposa. A luta, a esperança e a perda desta, a morte. Todas as coisas que constroem a vida: as estrelas entre as nuvens e a calmaria após a tempestade - e o abismo depois dela.
É o que leio, em outra viagem, enquanto o céu vai gradativamente perdendo a claridade e a noite nasce aos poucos. Ônibus cheio. Através das palavras, agora vejo as estrelas que se escondem por cima das nuvens escuras. Vejo a claridade da lua sobre elas. Sinto-me mergulhando nas certezas do mundo. Em queda rápida e serena, como Saint-Exupéry – o piloto – previu seu fim.


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