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quarta-feira, dezembro 17, 2008

castelo de paredes brancas

Crianças tímidas buscam confortos silenciosos. Quando foi que aprendera a chorar escondida? Foi depois de descobrir como fingir que tomava banho. Fechava-se no banheiro, ligava o chuveiro (no começo era a torneira, mas logo percebeu que o barulho não era o mesmo). Com as mãos, respingava água sobre o chão e o tapete. Umedecia a toalha. Com o tempo foi evoluindo rumo à perfeição: pisava no chão molhado do box e deixava as marcas dos pés no tapete. Ligava a água quente para suar os azulejos. E assim fez por quantas noites não se lembra, geralmente em dias frios que lhe impediam despir-se. Mas foi descoberta. Foi? Acordou um dia e lembrou-se da bronca que recebera do pai, o que levou alguns segundos para desfazer-se em memória de um sonho. Até hoje ele sequer suspeita.

Meninas, quando crescem, aprendem a gostar de banhos, especialmente nos dias frios. O sacrifício de expor o corpo ao ar gelado é recompensado com a água quente correndo por ele. Artifício para pensarem que saíra do banho, enquanto permanecia debaixo do chuveiro abraçada em si, jamais encontrou. A bronca que recebeu por desperdiçar a água tentou desfazer... mas era real demais. Quando se cresce a realidade tende a forçar-se acima do sonho.

Meninas, muito jovens mulheres, guardam sofrimentos que ninguém mais compreende. Todos dizem entender, todos clamam conhecer; mas subestimam. “Não é nada, vai passar” – se ela sofre, é claro que trata-se de algo. E que vai passar, sempre lhe foi tão claro – tanto quanto a diferença entre o som da torneira e o do chuveiro.

Romances escondidos requerem lágrimas discretas. Ah, sim! Foi aí que descobriu seu refúgio? Talvez não, mas a história cai bem. À beira do rio encontrou um refúgio para a alegria; onde guardaria a tristeza? Havia de ser mais perto. Um lugar ao qual confiasse o segredo.

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Encarava os azulejos brancos, em perspectiva, tão próximos de seus olhos molhados. O nariz tão perto da esquina, atrás da porta. Recostava o peito sobre as roupas usadas penduradas na parede, os braços cruzavam-se e as mãos repousavam na cintura. Ela cresceu, mudou-se, mudou. Já não tão tímida, o sorriso lhe caía melhor. Guardara a menina machucada dentro de si, mas essa era forte e esperneava para sair; ela já não era mais tão forte assim. Procurou o esconderijo que nunca a falhara e deixou-a sair. A menina agarrou-se às toalhas e roupas sujas, abraçou-as, respingou-as de lágrimas. Ela podia usar um conforto silencioso. O segredo, como todos os outros, perdeu-se nas superfícies lisas. Ninguém sequer suspeita.

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