Mariana gostava de ler livros estrangeiros. Mas seu pai dizia que não era possível ler sem entender palavra alguma. Porque palavras são pedaços das coisas, e as coisas aqui não são as mesmas que na Dinamarca. Lá a chuva vira neve e o mar congela por cima, o que impede os peixes de subir para respirar, ele dizia. O que nos leva à ocupação do pai de Mariana, que era pescador mas não pescava nas quartas-feiras, porque era dia de jogo do Avaí. Ele sonhava em visitar o Havaí, mas não sabia surfar. Seu filho, Marinho, não comia peixe. Vivia de arroz e pirão. Marinho gostava de feijão branco e tomates maduros e sua mãe gastava o dinheiro do aluguel para compra-los no mercado e seu pai batia nela quando ela o fazia. Mariana cantava como um frango sendo depenado. Mas ela não sabia, porque na sua casa não havia frangos, só peixes. Seu namorado dizia que sua voz era divina. Ela não acreditava em Deus. Deus não gostava dela e tudo na sua vida dava errado. Quando ela tentou aprender a surfar, uma onda a engoliu e só soltou-a quando ela prometeu nunca mais entrar no mar. A única vez que molhou os pés na praia, tropeçou e quebrou um dente. Marinho sonhava em ser dentista. O sonho era de sua mãe, e ele resolveu roubá-lo, já que ela virou esposa de pescador e passava o dia a limpar peixes.
Seu Antônio era peixeiro e vinha todo dia comprar peixe, e todo dia ele dizia que gostaria de vender camarão, mas o pai de Mariana não gostava de crustáceos. Ele achava que não deveria comer o que os peixes comiam, porque aí os peixes não teriam o que comer e não haveria peixes para ele comer, e ele morreria de fome. O pai de Mariana acreditava em Deus porque dizia que não custa nada acreditar. Deus o tolerava. Mas o mantinha pobre, porque um pescador que fica rico não pesca nem por esporte. E a mulher de pescador que fica rico não vira madame; vira perua. Deus não dava a mínima para a mãe de Mariana, contanto que ela lavasse a louça e esfregasse bem a roupa. Caso contrário, colocava uma baita aranhas no caminho dela. Ela não ligava uma coisa à outra e de vez em quando encontrava uma caranguejeira debaixo da pia. Mariana não tinha medo de aranhas e Marinho gritava como um porco. Mas ele não sabia, porque em sua casa não havia porco nem na noite de Ano Novo. Isso não significa que o pai de Mariana gostasse de peixe. Se gostasse, não os pescava. Mas os peixes gostavam dele, se não gostassem, não se deixariam pescar. E Deus não tinha nada a ver com a história.
("estou com vontade de digitar! vamos brincar de digitar coisas aleatórias?" - alguns minutos na aula de Jornalismo Online)
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